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Votos

Em 2023, por conta de uma peregrinação pelo Caminho de Santiago de 38 dias, eu passei um tempo curiosamente imerso em uma rotina semi-religiosa: eu fui a missas com uma freqüência tocante (no dia que cheguei em Santiago de Compostela, assisti a duas missas em menos de 24 horas); assistia a belíssimos sermões aos peregrinos, vindos de padres jovens e em espanhol; e pernoitava gratuitamente em monastérios e mosteiros.

Não é muita coisa, eu acho. Eu ainda estou perdendo feio para as velhinhas de cidade do interior que vão à missa todas as manhãs, se confessam, e ainda colocam dinheiro na caixinha do altar (para sustentar o João de Santo Cristo). Mas já é coisa demais para um agnóstico.

Essa rotina monastérica, alinhada com uma recente leitura do gigantesco e excelente livro “Pilares da Terra” foram alguns dos fatores que me deixaram interessados no documentário Votos, da O2 filmes. Não que sejam os únicos fatores: eu sempre fui um fã de temas religiosos — particularmente não deixo meu ateísmo interferir nessa questão. Sei o que é um claustro e seus objetivos; conheço as fábulas religiosas; já li a Bíblia, mesmo considerando-a 85% ficção; e sou um grande fã da culinária conventual, desde as cervejas trapistas até os doces portugueses baseados em gema de ovo (a clara do ovo era usada para engomar os hábitos das freiras, que tinham que ser criativas com as toneladas de gema que sobravam nos conventos).

Durante o caminho de Santiago, eu adorava passar os finais de tarde conversando com os padres dos monastérios onde eu me hospedava (aconteceu três ou quatro vezes apenas, mas todas muito marcantes). Talvez a minha idéia ao assistir Votos seria me transportar levemente a esses momentos.

É uma tarefa ingrata, que o documentário já começa perdendo: ele não vai reprisar meus sentimentos em uma viagem espiritual de auto-conhecimento. Ciente disso, sobram as interessantes histórias que ele tenta (e falha) aprofundar. Produzido pela Globonews, o filme tem uma pegada jornalismo-globo constante, e poderia facilmente ser um episódio de Globo Repórter para se assistir numa despretensiosa sexta-feira à noite.

Não é ruim: eu sou fã das produções jornalísticas do Globo Repórter. Mas para uma obra que quer aparecer na tela grande, parece que ficou faltando coisa.

Autor:
Barão do Principado de Sealand. Com uma inexplicável paixão por cinema, cervejas e queijos.